Pra quem está lendo pela primeira sobre o tema relacionado a endoscopia como técnica para tratamento de cranioestenose, eu sugiro também ler o post anterior que fala sobre escafocefalia. Embora os princípios da cirurgia endoscópica sejam muito parecidos entre os diversos tipos de cranioestenoses, incluindo idade para indicação da cirurgia e uso de capacete, existem nuanças que envolvem cada tipo específico.
A trigonocefalia é um dos tipos de cranioestenose, uni-sutural, ou seja, apenas uma sutura está envolvida no fechamento prematuro, que do caso da trigonocefalia é a sutura metópica ou interfrontal. Uma questão muito importante que difere a trigonocefalia das outras cranioestenoses é o conhecimento do tempo de fechamento das suturas cranianas. O que isso tem a ver? Veja, como sabemos maioria das suturas da calvária se fecham após os 18 anos, ou seja, o fechamento intra-uterino ou nos primeiros de vida vão causar uma alteração no formato craniano. Mas a sutura metópica se comporta de uma forma totalmente diferente, pois ela pode estar completamente fechada a partir do 3º mês de vida e ser completamente normal. Isso nos indica que o diagnóstico não deve ser baseado num exame de imagem que mostra o fechamento da sutura no primeiro ano de vida, mas sim nas alterações do crânio. As crianças que apresentam trigonocefalia vão apresentar um crânio com formato triangular na fronte, os pais normalmente referem que a cabeça fica “pontuda”, de fato, a cabeça assume um formato triangular onde o ápice do triangulo é a testa e a base a região posterior (occipital), além disso, essas crianças apresentam hipotelorismo, que é a aproximação das orbitas.
Uma vez estabelecido o correto diagnóstico através da avaliação clínica, cabe a decisão sobre a cirurgia. Assim como em outras cranioestenoses existem dois tipos principais de tratamento, mas todos são abordagens cirúrgicas, não existe tratamento clínico ou medicamentoso para trigonocefalia. A cirurgia pode ser minimamente invasiva por endoscopia e uso de capacete ou cirurgia convencional aberta que convenciona-se a chamar de avanço fronto-orbitário. Vou detalhar um pouco sobre as diferenças entre as técnicas, antes disso é importante ressaltar que as duas técnicas tem igual eficácia na resolução da trigonocefalia.
A técnica aberta é realizada normalmente após os 6-7 meses, alguns serviços preferem por volta dos 9 meses, o paciente recebe uma incisão de orelha a orelha em forma de zig-zag, atrás da linha de implantação capilar para “esconder” incisão com crescimento do cabelo, então toda ela pele da fronte (testa) é rebatida para expor os dois ossos frontais e os dois rebordos orbitários, então são feitas craniotomias (cortes nos ossos) para retirar os ossos frontais e depois são realizadas osteotomias para retirar o que chamamos de “bandeau” fronto-orbitário, ou seja, a porção superior das duas órbitas, depois que são feitos todos os “cortes” nos ossos eles são reconstruídos para desfazer a deformação que o fechamento prematuro da sutura metópica causou e são recolocados no crânio e fixados por placas absorvíveis, a pele é fechada e é feito o curativo. Esse tipo de cirurgia dura em torno de 3-5 horas, o paciente invariavelmente recebe transfusão de sangue, e faz pós operatório na UTI pediátrica por pelo menos 2 dias, enquanto fica com dreno de Blake ou Jackson Pratt, é muito comum ocorrer edema periorbitário, que costuma ser controlado com compressas. Além disso, são administradas medicação analgésicas (para dor). O paciente fica em média uns 4 dias no hospital.
A técnica endoscópica é realizada com até 3-4 meses de vida, o paciente rebe uma incisão de aproximadamente 2,5 cm na linha média, atrás da linha de implantação capilar, também para poder ficar escondida com crescimento no cabelo, a diferença que a incisão é muito menor, é realizada então com auxilio do endoscópio e pinças para remoção de osso uma suturectomia ou seja retira-se a sutura que fechou precocemente, para que a cirurgia seja efetiva é preciso tirar um “strip” de sutura de aproximadamente 5mm desde a fontanela anterior até a sutura fronto-nasal. Depois disso a pele é fechada e é feito curativo. Paciente não precisa de dreno, normalmente não recebe transfusão de sangue e recebe alta no dia seguinte. Dois dias após a cirurgia precisa fazer um novo escaneamento do crânio para a confecção do capacete, que deve começar a ser usado para moldar o crescimento do crânio, isso deve começar com até 7 dias da cirurgia, permanecendo com o capacete no máximo até o primeiro ano de vida.
Essas são as duas técnicas, a cirurgia por endoscopia tem uma limitação que é muito importante ressaltar ela depende do diagnóstico precoce, ou seja, a criança tem um “prazo” para realizar o procedimento que é até o 3-4 mês de vida. Mas o lado bom é que independente da idade existe tratamento que pode ser oferecido com ótimos resultados pós-operatórios.
Dr. Marcos Devanir Silva da Costa
Professor Afiliado do Departamento de Neurologia e Neurocirurgia
Escola Paulista de Medicina - UNIFESP
Pós-Doutorado, Doutorado e Mestrado pela Escola Paulista de Medicina - UNIFESP
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia
Membro Ativo da Sociedade Brasileira de Neurocirugia Pediátrica
Membro Internacional do Congress of Neurological Surgeons
Membro da International Society for Pediatric Neurosurgery
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